segunda-feira, 22 de junho de 2009

Música ao Perto












O amor que ainda não se definiu é como uma melodia do desenho incerto. Deixa o coração a um tempo alegre e perturbado e tem o encanto fugidio e misterioso de uma música ao longe...

Erico Veríssimo


Este trecho foi escrito em 1935. Dos tempos que mão dada era um rolo, dedo entrelaçado um namoro e mão na coxa apertando com os dedos um pernoite na cela da delegacia.

Muita coisa mudou desde então. Mais liberdade sexual, menos tecidos... Mas o amor continou, igualzinho aos tempos do meu vô Sérgio. E a música que toca com ele, também. Passam os bondes, chegam os carros e essa mesma canção ainda atravessa gerações.

Achar a frequência certa dessa música é como sintonizar um rádio antigo, desses que o dial são duas rodinhas, com a mulher de um lado e o homem no outro, separados pela caixa de som.

Um gostar mútuo, verdadeiro, é nada mais que uma sintonia entre ambas frequencias. Poucos sabem, ou percebem, mas para o afeto estar alinhado e os batimentos estarem no mesmo compasso, muitos fatores foram superados. Cada metade da laranja tem a sua bagagem amorosa, os seus problemas, o seu atual momento cardíaco.

E para um casal estar junto e genuinamente feliz, tudo tem que bater. Ou simplesmente ser relevado. Para dar certo, a vontade de se ver que vem meio de repente tem que ser maior que qualquer decepção antiga ou preocupação atual.

O problema, amigo meu, é que só vontade não basta. Encontrada a sintonia certa, onde a música flui sem ruídos e jingles da Mack Color, é preciso que ela seja boa aos ouvidos. Afinal, de nada adianta um rádio bem sintonizado se os acordes depois que soam lhe dão calafrios pelo corpo.

Isso acontece com o tempo e com encontros em cafés e mesas de barzinhos, quando num clique, algo lhe diz que para essa pessoa você não tem mais nada a dizer. Muitas vezes, por mais que você se esforce, repita o nome da pessoa na frente do espelho ou coloque no repeat músicas de edredom, chega como uma onda sem sal um inexplicável desinteresse. Entrou em cartaz “Ele - ou ela - não está tão afim de você.”

Há pessoas que simplesmente não te atraem, por mais que racionalmente tenha todas as qualidades que perfazem um bom companheiro. Não existe um motivo, simplesmente não desce. É como aquela comida, que desde criança você coloca a língua para fora e empurra o prato virando o rosto para o lado contrário.

Não gosto de frescura, tenho profundo preconceito – e assumo - com quem não come uma categoria inteira de comida, vide comentários como “Sabe, não gosto de tudo que vem do mar.” Agora, é de direito não gostar de azeitona ou strogonoff de frango. Não gosta e pronto, não desce. Respeito.

Funciona assim com pessoas. Simplesmente para o seu paladar amoroso não é agradável, e não há nada de errado nisso. O problema é explicar isso para o pretendente. “Desculpa, é algo da mistura entre creme de leite com catchup que pega pra mim. Você entende.”. Para quem lê isso com lágrimas nos olhos achando ser o motivo para todos os cacos do seu remendado coração, existe o contraponto da esperança.

Pense no seu prato favorito. Agora resuma em uma linha por que você adora quando vê ele perfumando o ar com seu vapor saboroso.

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Não tem por que resumir. É uma delícia, e pronto. Você gosta, te faz bem, você suspira e fecha os olhos a cada garfada. É assim.

O mesmo pode acontecer com a pessoa do outro lado da mesa. O que é inexplicavelmente desatraente em um, pode também ser de forma ainda mais misteriosa apaixonante em outro. E quando isso acontece, bem como seu prato predileto, você degusta cada pedaço com gosto.

Seja em música ou culinária, o importante é você estar sempre de ouvido afinado e panela a tiracolo. Ajustando o seu dial e sintonizando de estação em estação, para encontrar sua música predileta e fazer dela, trilha do seu jantar a dois.

2 comentários:

aron disse...

muito bom heim meu merda :D:D:D
ê texto gostoso :D
já encontrou sua musica né coco?
compositor de palavras... x)

Carina disse...

puta merda Fubá.

Esse texto me bateu tanto que nem vou dizer nada.

Até mais ver, meu caro. E como sempre, congrats!