domingo, 26 de julho de 2009

O Amor em Banda Larga













“É hoje!”, pensa Carlinhos esfregando as mãos mentalmente, uma vez que seus dedos estão todos postos no teclado. Já é noite na sua casa, e todos da sua família dormem o pesado sono de um dia pegando no batente.

Final do dia para uns, começo de uma promissora noite para outros. A linha está livre. Como Angus MacGaiver a escolher entre o fio azul ou vermelho, Carlinhos se acocora atrás do computador de mesa. Com cuidado e frieza, despluga o fio transparente de ponta cúbica do telefone, e o encaixa no modem do computador. Em cliques ansiosos, ele ordena que seu Windows 98 o conecte à internet.

Começa a contagem regressiva para o mundo da sedução. Ruído, chiado, barulhos, expectiva. Pimba! Online na rede mundial de computadores.

São poucos os que de fato escutaram uma buzina como essa pessoalmente. Contudo, para adolescentes como ele, não há nada mais familiar que esse barulho. Um longo e sonoro “PUOOOOON”.

De chegada no seu porto, um enorme navio carregado de expectativas.

O encontro já estava marcado, 11 da noite. Lá estava ela, enperiquitada com emoticons no nickname, a espera do primeiro contato. E para Dani, Carlinhos ofereceria o mundo e uma flor verde-limão, dando um oi com barulhinho engraçado.

Passaram-se 10 anos, algumas horas assinalando questões múltipla escolha com grafite tremido, um dia de cabeça raspada e tinta guache pelo corpo, muitas festas, choros e risadas. E hoje, Carlos todo dia das 9 a um 8 deitado, está online com o rosto iluminado por um monitor. E o que antes era mais uma ferramenta para combinar a ida à sessão das 8 de Titanic, hoje é simplesmente sua vida. A nossa vida.

Surfar na web era um esporte praticado por Carlinhos e seus amigos. A internet se tornou o ar que respiramos, em todos os planos e para fazer nossos planos. Hoje, muito além de pagar uma conta sem sair de casa ou despachar trabalho com um clique no outlook, as nossas relações pessoais dependem, mesmo que não integralmente, do auxílio da rede mundial de computadores. Nesse final dos anos 00 e além, somos internautas de escafandro complemente submersos nesse vasto oceano chamado web.

A prova disso está numa disciplina que até virou ganha pão. As redes sociais. Sites de relacionamento que tornaram-se gigantescos cardápios online. Afinal, que não é um Orkut ou Facebook senão uma uma página com frases de efeito e fotos selecionadas para um menu com barra de rolagem? Cada moldura clicável é como um prato: “Delicioso advogado de 26 anos, feito a partir de uma boa família de São Paulo, refogado com hábitos esportistas e baladadeiros, com um tempero de bom humor.”

Mesmo com as vastas possibilidades de ter extensões online da sua imagem para o sexo oposto, a essência das relações humanas é a mesma desde o tempo dos avatares em pinturas rupestres. Afinal, atrás do azulado do monitor existe alguém de carne, osso e ansioso, a espera da resposta de seu scrap ou do piscar alaranjado de um MSN com a mesma expectativa que Judite esperava por cartas de seu amado Bartolomeu. Hoje, só é tudo mais rápido e com mais recursos para contato do que um recado ou um telefonema rezando para que o possível sogro não atenda.

Com a internet e suas ferramentas, jovens enamorados se encontram e dançam o jogo da sedução de diversas maneiras. Se Carlinhos hoje decidesse reencontrar Dani pelas esquinas da vida, entraria na comunidade “Ex-alunos Colégio São Clemente”, descobriria se namorava e por onde andava, adicionaria no MSN, mostrando que seguia seu Twitter por recomendar seu post no garotasdepatins.blogspot ou o último vídeo engraçado do Youtube.

Para pedir risoto e meia garrafa de vinho com Daniela ao outro lado da mesa, Carlos acessou e usou cinco ferramentas diferentes, fora as mensagens de texto tecladas em momentos de inspiração alcoólica.

E todas elas conversam e convergem entre links e entre si, para o grande momento. A hora de mostrar-se olho no olho (não existe webcam) ser tão interessante quanto o perfil de quatro linhas ou engraçado quanto o tweet sobre o que aconteceu com ele numa terça de manhã. Nessa hora, ao som do tintilhar de pratos e música ambiente, não existe tempo de resposta cronometrado pelo pueril “C@rlos está digitando uma mensagem”. São instantes que a banda The Carlos precisa mostrar ser tão boa ao vivo quanto o trabalhado CD de estúdio.

A internet hoje é um claro reflexo da nossa geração: imediata, sem tempos para loadings e barulhos antecedendo a conexão. Queremos tudo, e agora. Acontece que não importa o que você tecla ou o endereço que escreve depois de 3 dáblios. Não é online que se roçam pés gelados entre cobertores.

domingo, 12 de julho de 2009

Diálogo de Domingo











No quarto com a penumbra de uma persiana dormem dois amigos. Um na cama de casal, outro numa caminha de solteiro. Procurando o sono, acordam. O rapaz da cama de casal estica o pescoço entre seu ninho de cobertores, vê o amigo e deita-se novamente, de olho no teto.

- Caramba, você que tá dormindo aí. Achei que fosse o Vitão.

Com a voz empastada de de sono, Ari responde de olhos ainda fechados:

- Não, o Vitão é muito grande pra essa caminha.

- Haha é memo.

- Que horas você chegou?

-Putz, umas 4 acho.

- Eu cheguei umas cinco. Você viu que levei sua jaqueta né.

- Vi sim, valeu! Fiquei procurando com a menininha, aí vi sua mensagem e fiquei sussa.

- É mesmo! Vi que você pegou ela, haha. Boa menino! Daonde você conhece?

- Ah da facul, amiga da namorada do Alê. Já tava interessado... Aí veio ontem na balada, e pimba.

Pablo o ergue os braços, colocando aspas maiores à sua citação:

- “Veni, vidi, vici.”

- Haha isso mesmo!

Ari fala isso orgulhoso e contente. E continua narrando seu conquista:

- Ficou enrolando... Tentava, ela esquivava... Aí levei para um canto, não falou nada...

- Ah! Quem cala consente meu amigo!

-Exato. Aí peguei. E veio a surpresa.

- Opa! Conta pra nois!

- Fogosa cara, puxava meu corpo pela camisa, pra chegar mais perto, roçando quadris.

- Ah, com essas o judô vem a tona até na parede da balada.

- É... Só faltou o ippon! Há!

Ambos riem. Silêncio. Lá fora passa um caminhão barulhento, saculejando uma caçamba de entulho.

- Cara, que ressaca. Parece que fui atropelado por um desses.

- Eu bebi bem também ontem. Mas você tava muito louco.

- Tava. Foram 100 pau só de cachaça. Mas uma hora que eu vi que tava muito bêbado eu segurei a onda.

Passa a mão no rosto, tentando tirar com os dedos a dor de cabeça que latejava nas suas têmporas. No meio da movimento, para e olha para a palma da sua mão, curioso.

- Caramba, tem um cortinho na minha mão.

- Como você fez isso?

- Ah, acho que dançando break lá na pista. Num vidro.

- Hahaha! Toda vez você faz isso.

- Ah pelo menos dessa vez não subi no palco.

- Haha! Não por falta de tentativa, seu merda!

- E aquela menina, te mandou mensagem?

- Mandou, mas meio seca, xoxa...

- Ah, ela tá muito fria pra tá na sua.

Silêncio.

- Preciso de uma coca, gelada.

- E frango de televisão.

- O kit ressaca! É bom que sobra rango daí.

- E final de semana tem mais.

- Frango ou história pra contar?

- Os dois meu amigo. Os dois.